Existe uma máxima que afirma que felizes são os ignorantes. Devem mesmo ser. O poder de comparação pode arruinar a vida de qualquer pessoa e transforma-la num ser criterioso demais, exigente demais e, em última e dramática instância, fresco demais. Nós que já fomos estilistas ou assistentes estamos fatalmente fadados a este mal, o de virar o cliente mala.
Depois de ter experiência com tecidos e processos, a pessoa consegue avaliar o que vale ser adquirido pelo valor anunciado (pouca coisa), quanto realmente seria justo pagar por determinada peça (quase nada), como irão se comportar as malhas e tecidos, quais peças ficarão povoadas por bolinhas após a segunda lavagem. Além disso, a pessoa repara nos acabamentos, nas costuras, não compra nada de abotoar que não venha com ao menos um par de botões sobressalentes e não tolera lingerie cor da pele.
Me dei conta do quanto lingerie pele é detestável quando, há poucos dias, precisei recorrer a um antigo sutiã bege. Era um modelo tenebroso cujas alças eram feitas por elásticos grosseiros, a medida das costas era menor que o suficiente, a copa era revestida por algo antiquado e de cor diferente do tecido e o resultado final era uma daquelas peças de roupa que dão tanta vergonha que alguém dispensaria o Johnny Deep só para não passar pelo constrangimento de estar vestindo essa... coisa.
Corri para a minha loja de lingerie preferida para comprar um sutiã novo: alças finas, tecido delicado, costas perfeitas, modelagem confortável. Ainda assim havia ali um elemento essencial que distorcia qualquer harmonia que pudesse haver entre forma e estética: a cor. O mesmo modelo de sutiã usando mesmo tecido em cor uva, azul ou verde claro era infinitamente mais bonito que o desgraçado do sutiã pele.
Lingerie cor da pele é, talvez, o item mais abominante que um guarda-roupas pode esconder e vai contra todo e qualquer ideal de liberdade de movimentos e conforto que a era pós-espartilho tem a oferecer visto que, uma vez dentro de um conjunto de calcinha e sutiã pele uma mulher não deveria atrever-se a sair de casa. A menos que a lingerie seja um conjunto de renda La Perla ou uma peça da Stella McCartney. E então começam as comparações e toda aquela história da ignorância vem à tona.
Deve acontecer o mesmo com quem começa a cozinhar: a pessoa passa a não engolir qualquer coisa. A marca do azeite vira uma questão, a massa só presta se for italiana e até mesmo a validade dos alimentos pode custar a cabeça do cozinheiro. Oras, há alguns séculos atrás comia-se carne putrefata e lambiam-se os beiços.
Não afirmo que todas as mulheres pensem como eu a respeito da tão citada cor de roupa íntima (certamente que Simone, a cantora, acha que essa minha idéia não faz nenhum sentido). Como ex-assistente de estilo de uma marca de lingerie comecei a desprezar sistematicamente toda e qualquer calcinha ou sutiã cor da pele, e nem mesmo aqueles tons achocolatados eu visto. Aposto que muitos homens me apoiariam na causa. Como não quero ser flagrada por aí sem roupa de baixo, tomei a decisão de não não mais usar minha calça de linho branca. E daqui por diante, só uso roupas coloridas com minhas lingeries estampadas por baixo.
:: Betty Friedan, uma das líderes feministas dos movimentos americanos de 60/70, afirma (em entrevista ao O Pasquim de 22/04/71) que jamais queimou-se um sutiã em passeatas.
3 comentários:
eba... 2 posts em 1 mês!
bjs
cara, o sutia que deixa meu peito mais bonito é... cor da pele!!!!!
alô, vamos atualizar?
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