quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Eu decidi dizer que eu nunca fui o tal...*

Os meus 3 graus de miopia chegaram a galope e sem aviso prévio, quase como o meu tamanho: um dia eu acordei comprida e não enxergava de longe. Foi quando o meu primeiro dilema estético surgiu, calcado em questões de fundo psíquico gravíssimas criando uma logística física que apenas não procedia. Minhas questões eram de diversos tipos: como conciliar óculos com aparelho fixo aos 15 anos e não ser excluída socialmente? Alguém vai querer beijar minha boca juntando esses dois fatores a um cabelo cacheado? E na aula de ballet, como vou fazer diagonal de debulê mantendo as hastes na cara?

Outras dúvidas eu tinha quando colocava um short e pensava: será que minhas pernas ainda vão crescer mais? Quem vai me aceitar assim desse jeito cheia de pernas e metais no rosto? Até de calça eu parecia ser apenas uma cabeça em cima de duas pernas longas. Enquanto minhas amigas tinham pares de seios e outras curvas muito mais atraentes, eu calçava 38 e tinha que diminuir o passo pra acompanhar a turminha. Literalmente.

A solução chegou quase tão rápido quanto o problema de vista: lentes de contato e calça de cintura baixa. A dobradinha era perfeita: de manhã eu ia de óculos e camisola até o banheiro, colocava as lentes e de volta ao armário eu vestia uma calça ou qualquer outra coisa de cintura baixa, me transformando, então, num ser aparentemente normal.

Passados uns 10 anos eis que mais um dilema estético aparece, e dessa vez parece ainda mais complexo.

Tão espontâneo quanto a chegada da miopia foi a alergia que agora me acomete: não posso mais usar lentes de contato. Do dia pra noite meus olhos começaram a coçar, arder e incomodar de forma que fui a dois oftalmologistas que me diagnosticaram da mesma causa e prometeram a cura idem. Passado um mês de pingações insanas de colírios, eis que a alergia persiste e minhas pesquisas e enquetes pessoais apontam para a trágica conclusão de que não mais poderei usar as lentes, donde uma nova leva de perguntas brota, sendo a última a mais dramática: como faz pra mergulhar no mar de óculos (fiz o teste hoje – levanta-se o braço que segura o óculos escuros de grau, mergulha-se rapidamente e dá-se a largada rumo a areia, sem direito a ficar boiando)? Óculos e brincos grandes, dá pra usar tudo ao mesmo tempo? E óculos e echarpe e brinco juntos?! Como faz pra ir pra natação sem lentes (ainda que não haja nada imperdível no fundo da piscina...)? e se chover no show da Madonna, como vou enxergar a vida ao meu redor com óculos encharcados??!

Penso em comprar um boné impermeável para o evento, bem como uma galocha.
As pernas não mais cresceram. E mesmo com essa moda de cintura alta e pantalonas, não me abalo, afinal as tendências são democráticas. Troquei o aparelho fixo por um piercing e fiquei apaziguada com meu cabelo cacheado. Mas quatro-olhos, isso não, me recuso. Me sinto completamente desamparada vendo o sol nascer quadrado.

* Paralamas do Sucesso in Óculos (dãr).

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

I'm just a soul whose intentions are good

No Bazar N.E.O é assim: todo mundo quer promoção, todo mundo quer "esse modelo nessa estampa, tem?", as pessoas não entendem porque um vestido de seda pura custa 500 reais (elas não sabem que o metro da seda custa 50...), alguém experimenta uma blusa da marca vizinha e de repente todo mundo quer a mesma, todo mundo canta em coro quando toca Amy Winehouse, as pessoas comentam o último capítulo da novela, todo mundo pergunta "pode dividir?", as tiaras de cabelo são cobiçadas e todo mundo que compra já sai usando, os copos divertidos da Q-Guai são uma sensação, tem sempre alguém muito grande que acha que vai caber num vestido P (e geralmente essa pessoa quer experimentar o mesmo, e a gente fica torcendo pra não rasgar a peça), e tem sempre alguém que compra um scarpin um pouquinho apertado, ou pouquinho maior pra usar com uma palmilha, as pessoas vêem as roupas infantis da Domitila e pensam que são blusinhas para adultos, quase que não cabe todo mundo dentro da casa ao mesmo tempo, as mulheres enlouquecem quando você diz "nesse cesto tudo por 50 reais", os namorados ficam com uma cara de tédio, todo mundo compra coisas que no fundo não precisa comprar mas é sempre bom aproveitar a oportunidade, as mulheres a-mam estampa de oncinha!, até o Botequim Informal faz promoção do tipo "pague um leve dois", as pessoas ficam loucas quando vêem sapatos fofos, também saem com as jóias da Livia Canuto nas orelhas, pescoços etc, algumas pessoas só compram depois de ouvirem a opinião da irmã, da amiga, da mãe ou do primo, todo mundo se lambuza com os cupcakes coloridos e deliciosos, lá pelas 20h chega um sujeito carregando um filhote de pug chamado Rafael vestindo camisa pólo de tricot e ninguém mais quer saber de comprar nada, quase não dá tempo de sentar, perto das 19h o Fred toca alguma música dos Jackson 5, no último dia a varanda dos fundos vira uma pista de dança improvisada onde uma cliente sua de tanto dançar, outra que usa um vestido bordado faz um penteado de Frida Kahlo, todos hablam español, gritam "ai ai ai ai ", batem palmas como se fossem castanholas e se divertem sem se importarem com seus tomara-que-caia caindo.

Não se confunda: ninguém quer saber de roupa quando está morrendo de rir.





:: Isa Lima bebendo no copo da Q-Guai.

::: Last Night a Dj Saved My life

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

La Dolce Vita

“Eu gosto de beleza. Não é culpa minha.” A frase, dita por Valentino Garavani, é emblemática e também a que dá mais sentido ao documentário sobre os últimos anos de trabalho do estilista italiano. “Valentino - O Último Imperador" (“Valentino – The Last Emperor” no original) é o filme de Matt Tyrnauer, correspondente da revista Vanity Fair, que sintetizou mais de 250 horas de gravação numa película contundente. O documentário é um retrato do homem que por muitos é considerado o último verdadeiro couturier e que ficou à frente de sua empresa por mais de 40 anos desafiando todas as regras de sobrevivência das grandes maisons de moda.

Amante do luxo, Valentino começou sua carreira em Paris como assistente de grandes costureiros. Mas foi na sua Itália natal onde adquiriu projeção internacional e foi a partir de seu encontro com Giancarlo Giametti que sua carreira deslanchou. Os dois se conheceram num café em Roma e pouco depois Giametti largou seus estudos para dedicar-se ao atelier de Valentino. A cena em que os dois estão em frente ao Café Paris seria suficiente para entender a engrenagem que os une há mais de quatro décadas: Valentino insiste que não foi ali onde se conheceram e dá sua versão dos fatos. Giametti sai de cena, deixando o astro genioso brilhar, enquanto sorri. Em outros momentos do documentário, a história se repete: Valentino questiona a escolha de cabeleireiros, a escolha do museu onde haveria uma exposição retrospectiva de seus 45 anos de carreira e, numa cena onde o diretor não ousa acatar os pedidos de desligar a câmera, Giametti e ele discutem seriamente a respeito do conceito de um dos desfiles. Giametti sabe até onde enfrentar seu sócio, e Valentino, por sua vez, sabe que pode confiar no homem que botou seu trabalho no mapa mundial da alta-costura.

Ao longo do filme a dupla sabe, também, que o reinado do costureiro parece resistir bravamente às manobras que todas as casas de moda estão adotando para sobreviver. Eles sabem que fazem o impensável para os padrões de consumo dos anos 00, têm consciência de que são a resistência. O estilo criado por ele parece estender-se a seus hábitos de vida e constatamos que a opulência permeia tudo que o cerca: seu château em Paris acolhe seus convidados, de Anna Wintour a Gwyneth Paltrow, numa festa durante a semana de moda francesa. As outras residências, entre elas sua villa italiana, seguem o mesmo padrão. É nostálgico: a costureira-chefe do atelier esbraveja a torto e a direito como uma típica nonna italiana, Valentino desenha cercado por seus cães de pedigree enquanto divaga sobre a beleza e os desejos das mulheres e garante que sabe o que elas querem, e tudo o mais ao redor do estilista parece ter parado no tempo.

A parte final do filme emociona: vemos um Valentino incansável, porém consciente de que sua filosofia de trabalho não cabe mais aqui, sendo parabenizado por um Karl Lagerfeld igualmente comovido na exposição que celebra seus 45 anos de carreira. O kaiser cochicha ao pé do ouvido: “Nós não podemos parar. O que os outros fazem não se compara ao que nós fazemos.” Mas é inevitável, e perto do desfecho Valentino anuncia sua aposentadoria.

Há dois grandes méritos no filme de Tyrnauer, sendo o primeiro o acesso irrestrito que o diretor conseguiu ao estilista e ao seu entorno e que transporta o espectador imediatamente para o mundo de sonhos de Valentino. O segundo é que ele narra a história do grande estilista ao mesmo tempo que nos dá um panorama conciso das mudanças significativas enfrentadas pela grande indústria da moda e do luxo. No grand finale, bailarinas suspensas por cabos dançam vestidas com roupas esvoaçantes e fogos estouram na frente do Coliseo, em Roma. É o começo da eternidade do último imperador.

http://www.youtube.com/watch?v=FHtomiokQ1w

domingo, 24 de agosto de 2008

Alô polícia! Eu to usando...

Existe uma máxima que afirma que felizes são os ignorantes. Devem mesmo ser. O poder de comparação pode arruinar a vida de qualquer pessoa e transforma-la num ser criterioso demais, exigente demais e, em última e dramática instância, fresco demais. Nós que já fomos estilistas ou assistentes estamos fatalmente fadados a este mal, o de virar o cliente mala.

Depois de ter experiência com tecidos e processos, a pessoa consegue avaliar o que vale ser adquirido pelo valor anunciado (pouca coisa), quanto realmente seria justo pagar por determinada peça (quase nada), como irão se comportar as malhas e tecidos, quais peças ficarão povoadas por bolinhas após a segunda lavagem. Além disso, a pessoa repara nos acabamentos, nas costuras, não compra nada de abotoar que não venha com ao menos um par de botões sobressalentes e não tolera lingerie cor da pele.

Me dei conta do quanto lingerie pele é detestável quando, há poucos dias, precisei recorrer a um antigo sutiã bege. Era um modelo tenebroso cujas alças eram feitas por elásticos grosseiros, a medida das costas era menor que o suficiente, a copa era revestida por algo antiquado e de cor diferente do tecido e o resultado final era uma daquelas peças de roupa que dão tanta vergonha que alguém dispensaria o Johnny Deep só para não passar pelo constrangimento de estar vestindo essa... coisa.

Corri para a minha loja de lingerie preferida para comprar um sutiã novo: alças finas, tecido delicado, costas perfeitas, modelagem confortável. Ainda assim havia ali um elemento essencial que distorcia qualquer harmonia que pudesse haver entre forma e estética: a cor. O mesmo modelo de sutiã usando mesmo tecido em cor uva, azul ou verde claro era infinitamente mais bonito que o desgraçado do sutiã pele.

Lingerie cor da pele é, talvez, o item mais abominante que um guarda-roupas pode esconder e vai contra todo e qualquer ideal de liberdade de movimentos e conforto que a era pós-espartilho tem a oferecer visto que, uma vez dentro de um conjunto de calcinha e sutiã pele uma mulher não deveria atrever-se a sair de casa. A menos que a lingerie seja um conjunto de renda La Perla ou uma peça da Stella McCartney. E então começam as comparações e toda aquela história da ignorância vem à tona.


Deve acontecer o mesmo com quem começa a cozinhar: a pessoa passa a não engolir qualquer coisa. A marca do azeite vira uma questão, a massa só presta se for italiana e até mesmo a validade dos alimentos pode custar a cabeça do cozinheiro. Oras, há alguns séculos atrás comia-se carne putrefata e lambiam-se os beiços.

Não afirmo que todas as mulheres pensem como eu a respeito da tão citada cor de roupa íntima (certamente que Simone, a cantora, acha que essa minha idéia não faz nenhum sentido). Como ex-assistente de estilo de uma marca de lingerie comecei a desprezar sistematicamente toda e qualquer calcinha ou sutiã cor da pele, e nem mesmo aqueles tons achocolatados eu visto. Aposto que muitos homens me apoiariam na causa. Como não quero ser flagrada por aí sem roupa de baixo, tomei a decisão de não não mais usar minha calça de linho branca. E daqui por diante, só uso roupas coloridas com minhas lingeries estampadas por baixo.



:: Betty Friedan, uma das líderes feministas dos movimentos americanos de 60/70, afirma (em entrevista ao O Pasquim de 22/04/71) que jamais queimou-se um sutiã em passeatas.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Sobre calças

Eu dormia metida nas calças do uniforme do colégio durante o inverno. Era uma calça de helanca azul com uma listra branca na lateral e elástico na cintura. Essa parecia ser a melhor função da peça: esquentar (muito). E me poupar daqueles segundos desagradáveis e congelantes em que, às 6 e meia da manhã, você tira o pijama e coloca outra roupa. O corte da peça era provavelmente pavoroso e possivelmente o motivo por eu ter passado anos a fio com somente dois ou três pares de calça pendurados no armário. Além de horrendas, aquelas calças eram também a única opção para freqüentar o severo colégio de padres, que proibia terminantemente pernas de fora, além de ombros, barrigas e pés. Como numa ditadura, o uniforme tenebroso era a tendência imposta para neutralizar qualquer inclinação fashion dentro dos portões da escola.

Findo o ensino fundamental, o uso de uniformes era suspenso e o aluno passava a freqüentar o prédio que ficava do outro lado da rua. Era a promessa de vida em nossos corações, como diria Jobim. Estava decretado o fim do uso da calça de helanca, o fim do constrangimento de ver a calcinha marcando os bumbuns das meninas, o fim do casaco de moletom escondendo as traseiras naqueles dias, era, enfim, a democratização de todas as outras calças, cortes e modelagens.

Mas a liberdade, como se veria, ainda encontrava-se distante dali. A patrulha anti-estilo dos padres era quase tão ameaçadora quanto a dos próprios colegas e aos 16 anos você precisa da aprovação destes. Se de um lado os padres implicavam com as calças skinny por elas serem justas demais, de outro os amigos debochavam do que você estaria escondendo dentro de sua confortabilíssima calça baggy. Os padres barravam qualquer menina usando calças capri, que deixavam à mostra alguns centímetros das canelas, enquanto que os encrenqueiros de plantão faziam de tudo para puxar as cordinhas e amarrações que seguravam na cintura as calças clochard (os meninos realmente amadurecem depois). Até mesmo as aparentemente nada insinuantes calças cargo eram mal-vistas, pois seus bolsos podiam esconder uma série de papeizinhos cheios de cola em dia de prova. Os modelos de calças jeans eram os mais aceitos e em pouco tempo parecíamos todos uniformizados novamente, como que patrocinados pela Levis.

O que os padres não entendiam é que naquela idade nossos gostos se afirmavam e nossas personalidades se solidificavam e as roupas eram, como ainda são, uma forma de nos expressarmos, de nos diferenciarmos, de nos agruparmos em tribos ou até mesmo de nos rebelarmos contra nossos pais. Os roqueiros se reconheceriam através de suas calças largas com correntinhas penduradas, mas as mesmas eram proibidas porque eram armas brancas em potencial. As meninas morreriam de inveja umas das outras numa competição de que calça de alfaiataria tinha o vinco mais marcado e mais um monte de jovens se identificaria uns com os outros, mas não, depois da calça de helanca enfrentamos a era jeans.

Nos anos imediatamente posteriores ao ensino médio, eliminei boa parte das minhas calças jeans do armário. Calça só quando extremamente necessário, e elas tinham de ser no mínimo extravagantes: boca-de-sino colorida, saruel de malha bem levinha semi-transparente ou qualquer outro modelo que me faria ser expulsa sumariamente do colégio.

Durante anos só comprei vestidos e abusava de saias rodadas, de preferência de estampas florais delicadas, algo bem ao estilo pré-feminismo.

Levei anos para entender que os padres não eram contra a moda ou contra as inovações que os estilistas propunham. Eles queriam apenas nos reduzir a estudantes disciplinados cujo dever era obter boas notas e bons resultados nos vestibulares. Na visão deles o que importava mesmo era a carreira profissional que só começaria com êxito se houvesse bom rendimento escolar e para tal qualquer provocação ou distração deveria ser banida, fossem elas mau comportamento ou calças apertadas demais.

No dia em que finalmente compreendi que os padres estavam mais preocupados com números que com a nova tendência de jeans cigarrettes estonadas pude curar o trauma e voltar a usar calças. Nunca mais dormi com elas (salvo raras exceções), mas desenvolvi um olho excelente para encontrar modelos arrojados e desfilar com eles pelos corredores da minha nada católica faculdade.





(esse texto foi escrito após a primeira aula do curso de Jornalismo de Moda, onde aprendemos a identificar modelos e formas. A idéia era escrever um texto sobre o que foi falado: calças. Eis o meu.)

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Por trás dessa lente

Releitura - é disso que vive a moda. A cada nova estação o que vemos é mais do mesmo, porém adaptado aos tempos. A palavrinha é curinga em qualquer texto sobre o assunto. Em alguns, encontramos os sinônimos: reeditado, um perfume de..., repaginado. É batata.

Nos anos zero, alguém que era alguém no mundo saiu de casa vestindo seus óculos Wayfarer e desde então eles ganharam as ruas. Os Wayfarers foram desenhados em 1952 e fizeram fama em rostos como o de Bob Dylan, Audrey Hepburn e Andy Warhol, entre outros.


Antes disso, os Ws foram muito populares nos anos 80 graças a suas aparições em sucessos como Miami Vice e em mais rostos célebres como os de Jack Nicholson, Morrissey, Johny Marr e Elvis Costello. Foi a época das mais altas vendas do modelo da Ray Ban, originalmente desenhado para pilotos.


Nos anos zero os Ws sofreram alterações em seu design original que foram consideradas "horrorosas" por um renomado jornal inglês. As tais alterações pareceram não importar a quem quer que seja que o tenha colocado um dia, e essa pessoa era alguém pois em poucos meses os Wayfarers estavam ocupando cabeças de pessoas cool como Chloe Sevigny e uma das irmãs Olsen. Estava lançada a tendência: de 2007 e 2008, se você é alguém cool, não sai de casa sem os seus Wayfarers, pretos ou coloridos, tanto faz.


Junto da onda oitentista que se abateu sobre o mundo da moda, os Wayfarers vieram bem a calhar. Combinados com as calças skinnys e camisetas engraçadinhas que remetem aos tempos New Wave, calçados com Reeboks nos pés, o povo antenado usa e abusa das lunettes de acetato.


A mania parece durar tempo demais, mas não se engane: nós não usamos calça de cintura alta a vida toda, um dia todo mundo se encheu e a Gang teve seu lugar ao sol. Logo a moda se esgota e relê alguma outra coisa. Enquanto isso os Wayfarers não saem das cabeças de um monte de gente (bem como as músicas do B-52s não saem da minha cabeça cada vez que vejo um deles na rua). Pena que eu não guardei o meu par...


terça-feira, 10 de junho de 2008

O Fashion Rio do meu tempo

Antes de virar Fashion Rio, a semana de moda carioca acontecia numa grande tenda montada no estacionamento do BarraShopping. Dentro desta havia divisões que formavam as diferentes salas de desfiles. Já naquela época as salas tinham as arquibancadas que até hoje existem, um grande número de assessores de imprensa e o Caderno Ela fotografando os modelitos dos anônimos que circulavam nos apertados corredores.

A Mara Mac ainda era Mariazinha, Frankie ainda não era suspeito de ter assassinado Amaury (ou vice-versa), a Totem era a nova febre, Lenny e Salinas já eram as grandes marcas de moda praia (porém seus biquínis tinham preços decentes) e eu tinha convites para um dos primeiros desfiles da Santa Ephigênia porque era cliente dos tempos de Mercado Mundo Mix (quando este acontecia na Fundição Progresso).

Eu e minha irmã íamos aos desfiles e a tia Ana se encarregava de nos colocar pra dentro dos outros para os quais não tínhamos entrada. Regina Guerreiro era a mais Vip dos Vips. É mais ou menos tudo o que consigo lembrar.

Provavelmente achávamos bacana por ser um programa novo e fora do comum. Não pensávamos se o evento atraía investidores para o crescente mercado de moda, se novos criadores ganhavam visibilidade, se os modelos apresentados eram comerciais, conceituais, bem costurados, bem modelados, se as meninas eram anoréxicas, se a luz estava em sincronia com a trilha sonora. No máximo ficávamos animadas com os vestidos e biquinis bonitos que poderíamos comprar depois de alguns meses. Sim, poderíamos comprar.

Passados muitos anos, a Semana de Estilo BarraShopping virou Fashion Rio no MAM e depois na Marina da Glória. A Santa Ephigênia deixou de me enviar convites. A Lenny Niemeyer aparece num comercial de televisão dizendo que há um grande investimento no Rio de Janeiro (será?). A Salinas continua arrasando na praia, a Mara Mac no asfalto e a Totem na trilha sonora (sempre melhor que as roupas).

Minha última maratona de desfiles foi há algumas temporadas atrás quando era assistente de produção da Zizi, que tinha poderes ilimitados entre os assessores de imprensa e substituiu a tia Ana. Nessa época uma amiga cobria os desfiles com a Iesa e nos encontrávamos nos intervalos nos lounges, sempre tirando as pashiminas ou casacos que usávamos para enfrentar o frio que fazia dentro das tendas. Sabíamos a diferença entre vichy, tartan e madras. Sabíamos o que era georgette, chifon e seda estonada. Sabíamos também que a Extra teria os melhores acessórios e sandálias e que qualquer vestidinho estampado custaria tanto que não os compraríamos. Carregávamos bolsas e sacolas e cadernos que ganhávamos de brinde e sabíamos quem era quem nos bastidores do mundinho fashion, como (irritantemente) diz a Érika Palomino.

Provavelmente achávamos bacana por ser um programa onde nos inseríamos com objetivos profissionais, onde podíamos refinar um pouco nosso olhar sobre a produção de moda no Rio, mesmo que fosse a roupa do mainstream, mesmo que fosse um jogo de cartas marcadas.

Sobre a atual e as últimas temporadas na Marina da Glória, não arrisco uma palavra. Virei uma outsider completa. Tudo o que sei é que a Beta trocou a Iesa pela Gema, um amigo desfilou pela Totem. Vi algumas fotos em sites, achei o desfile da Mara Mac deslumbrante, o da Salinas também. Li algumas coberturas e continuo achando que a maioria dos jornalistas de moda tem um tom prepotente que nos faz desistir de ler qualquer análise além da 4a linha. O que me chama mais atenção é como os corredores, agora largos e ao ar livre, viraram o centro das atenções onde os anônimos exibem suas roupas transadas e posam para lentes com a mesma desenvoltura das modelos. A passarela não é mais a estrela da festa e muitos desfiles deixaram de ser desfiles para virarem performance.

Fica a pergunta: será que mudou tanto assim?

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Quotes

"This is a word that would need a book to give it its right definition! I will only say now that elegance must be the right combination of distinction, naturalness, care and simplicity. Outside this, believe me, there is no elegance. Only pretension."

Christian Dior sobre Elegância.

"Disse alguém que a verdadeira elegância não é sequer notada. Não andemos tão longe. Mas é necessário convir que não é pela atenção que se chama que se pode avaliar a elegância. (...) Não use roupas que a incomodam. Por mais belas que sejam, ao fim de algum tempo, prejudicarão a graça dos gestos, a naturalidade dando um ar 'endomingado' a quem as use. Quem pode sorrir espontaneamente quando a cinta está tão apertada que quase tira o fôlego? (...) Um dos melhores modos de usar bem um vestido é, depois de vesti-lo, esquecer-se dele."

Clarice Lispector sobre Elegância.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Vestido no Rio de Janeiro

Todo dia, a caminho do trabalho, passo por algumas vitrines e as olho sem me deter. A maioria é de lojas onde raramente entro e certamente nunca compro. Algumas são aquelas lojas típicas de Copacabana que ainda vendem vestidos de festa plissados combinando com a echarpe e tailleurs feitos de tecidos com ar decorativo. Outra, na verdade, é uma mini galeria de roupas de ginástica. No meio delas, uma série de lojas de moda jovem daquelas que vemos por toda a cidade.

Um dia em que caminhava com mais calma pro escritório, achei simpática uma blusa cinza numa das vitrines. Uma blusa básica, manga comprida, uma gola bacaninha, uma peça dessas sem complicações, quase uma Hering branca.

Na hora do almoço voltei pra vestir e quando cheguei na porta achei estranho porque de manhã a blusa era cinza e agora estava verde. Aí me dei conta de que não era a mesma blusa, tampouco era a mesma loja. Nessas horas é batata, você tem certeza que está no Rio de Janeiro e que o mercado de moda aqui funciona de forma muito simples. Não é implicância. Nos últimos anos surgiu uma horda de lojas que bebem da mesma fonte. As vitrines já denunciam. As deste inverno, por exemplo, contém uma galocha, meias opacas, shortinhos, manguinhas românticas e suas versões do sapato Oxford. Invariavelmente. Tiveram sua fase viscolycra, aderiram à viscolã, houve a época dos casaquetos à la anos 50, os vestidos com legging. Agora todas têm sua própria linha de lingerie e de objetos para casa.

Quando o assunto é moda, eu sou contra o sistema mesmo, porém não é gratuito. A minha relação com a roupa vai muito além de um senso estético ou do que é bonitinho ou do que está nas revistas. O que uso e compro está diretamente ligado com o que escuto, leio ou converso. Eu não consigo me prender a um único assunto, a um único tipo de música ou a um único gênero de filme. Com roupas não seria diferente. Eu aprecio a camiseta fofinha de malha ecológica de bambu ao mesmo tempo em que sou louca pelas peças conceituais do Felipe Eiras. Acontece naturalmente, você lê a Bravo e a Caras, vê filmes asiáticos e sabe as músicas da Noviça Rebelde de cór.

A moda vendida cada vez mais aqui é aquela que já vem pronta dos sites e palestras de tendências, das marcas que todo mundo visita quando viaja pra pesquisar, das mesmas modelagens que todo mundo copia de revistas e afins. Se os estilistas reproduzem as referências sem qualquer reflexão o público não fará menos que consumir idem. O que acontece é essa pasteurização das vitrines e diversas marcas que antes tinham identidades tão próprias acabaram virando apenas mais uma. Dá pra morrer de tédio em um piso do shopping.

Por um lado você nunca se sentirá rejeitado, fashion-mente falando. Por outro será mais um peixe listrado nadando junto ao cardume. No fundo é mais fácil. E é aí que está o X da questão. A postura que você adota com o seu guarda-roupa nada mais é do que uma extensão da postura que você adota pra sua vida. Pode soar dramático demais para quem acha que moda é uma futilidade. Mas não é o que usamos todo dia?


quarta-feira, 30 de abril de 2008

Um repelente, por favor.

Eu li A Peste quase ao mesmo tempo que o Marcelo. Foi um dos livros mais perturbadores que já tive em mãos. Provavelmente o Marcelo sentiu o mesmo. Não por acaso, uma noite ele me telefonou para dizer que estava mal por causa de um episódio específico do romance. Eu ainda não tinha chegado na tal página mas já estava mal desde as primeiras linhas. Achei impossível que a história ficasse ainda mais dramática, fiquei nervosa e quis mudar de leitura, mas era um caminho sem volta e fui até o fim. E assim, o Marcelo primeiro e eu logo depois, terminamos o livro apavorados. Pensávamos no que fazer se a peste chegasse à nós. Aos poucos nossas vidas voltaram ao normal.


Até que veio o verão e a proliferação de dengue. O que isso tem a ver com moda?


7h30 da manhã, parada à frente do elevador de um edifício comercial em Copacabana, uma senhora típica de sobrancelhas pintadas e trajando: calça estampada fundo branco com hibiscos laranja queimado; camiseta de malha terracota sob camisa aberta de botão estampada fundo bordô com flores laranja queimado; bolsa de pano coral atravessada. Ela me olha de cima abaixo e diz: "Você está bem vestida contra o mosquito!"


Ela ainda se corrigiu a tempo: "Só faltava uma meia...!"


Ela disse isso tudo como quem exclama que só faltava a piteira pra completar meu figurino de melindrosa.


Pelo fim da peste denuncie os focos de mosquito e use calça skinny!


sábado, 12 de abril de 2008

Dressed for succes

Aggyness Deyn é a nova Kate Moss. Não sou eu quem confirma, é a I-d que dedicou sua última edição a ela. Você pode escolher, entre 6 opções de capa, a sua versão Aggyness preferida.

Eu não sei vocês, mas eu não quero viver num mundo onde Aggyness é a nova trend-setter. Não porque eu não goste da moça, mas porque acho que se os entendidos da moda a consideram trend-setter na era Madonna, então alguém perdeu um capítulo importante dos anos 80.


Digo isso porque Aggyness se veste, conceitualmente falando, como a Madonna, só que 20 anos depois. Não é que eu perca meu sono com isso, e nem mesmo fico irritada. É só que a gente percebe a falta de criatividade quando os espertinhos elegem como nova inspiradora alguém tão déjà vu.


quarta-feira, 26 de março de 2008

Hoje o céu está tão lindo

Todo mundo teve uma galocha vermelha. Todo mundo foi de galocha vermelha pro colégio. Logo depois da galocha, muita gente teve um L.A Gear de dois cadarços. Depois de um tempo, todo mundo teve aquele reebok branco com uma listra na lateral da sola. A minha era rosa. Passado o reebok, todo mundo teve um Keds branco, pelo menos um genérico. Junto do Keds, todo mundo tinha uma botinha da Mr Cat pra usar nas festas à noite. E junto da botinha, todo mundo teve um mocassim de bolinhas na sola, provavelmente também da Mr Cat. Depois do trio Keds-Botinha-Mocassim, todo mundo teve um Adidas. E junto do Adidas, todo mundo tinha sandálias altas pra usar nas noites. A ditadura do All Star veio depois e então nós que entre um Reebok e um Keds tivemos All Star pudemos relembrar os velhos tempos de infância.

Aparentemente, alguém muito importante resolveu resgatar sua galocha vermelha. Aparentemente também, essa pessoa achou prudente dar uma repaginada na galocha, fazer um xadrez, estampas, fivelinhas e o que mais fosse necessário pra deixa-la desejável a uma horda de consumidores.

Talvez sejam as águas de março, talvez seja que o Rio não tem nenhuma personalidade no vestir-se, talvez seja o mosquito da dengue, fato é que ameaça chover (e tem chovido) e as ruas são invadidas por galochas de muitos tipos, cores e tamanhos.

Eu não vou comprar uma galocha. Nada contra, acho até divertido. Mas não me venham com mocassins de bolinha...

sábado, 15 de março de 2008

etiqueta de composição

Lia Rodrigues adora nudez e a explora constantemente em seus ballets. Em questão de minutos seus bailarinos ficam nus. Carlota Portella se valeu do tema em uma de suas peças de dança, de forma mais sutil e lindamente iluminada. Zé Celso desnuda seus atores e isso já virou marca registrada. Gal Costa já cantou com os seios à mostra. David de Michelangelo ficou imortalizado sem roupas, assim como incontáveis musas e deusas ao longo da história da arte. Marylin Monroe aparece estonteante em sua última sessão de fotos, exposição que veio ao Rio em 2007. Adão e Eva eram adeptos da moda.

Eu aprecio a nudez em suas diversas formas. Mas gosto mesmo é de roupas.

Imagino uma série de indivíduos nus e todos me parecem iguais. Uma vez equipados com blusas, calças, camisas, saias, vestidos haveria uma série de detalhes e formas diferentes, surpreendentes. Acredito que a roupa revela muito mais particularidades de uma pessoa que seu corpo nu e acho que no fundo as nuances dos seres me interessam muito mais que o cru de cada um.

Um tênis, um rasgo na calça, uma combinação de cor. As roupas nos dão impressões e dicas sobre a personalidade de alguém, às vezes sublinhando, outras tentando ocultar certos aspectos e fatalmente são a primeira impressão que temos de desconhecidos.

É por isso que tendo a gostar mais de gente vestida que de gente pelada. Já dizia o Ultrage a Rigor: pelado todo mundo fica, todo mundo é. Com roupas, o buraco é mais embaixo.